Seu navegador não suporta java script, alguns recursos estarão limitados. Água, Vida e Direitos Humanos: evento reúne Ministérios Públicos, Judiciário, Legislativo e acadêmicos - Conselho Nacional do Ministério Público
Sustentabilidade e Meio Ambiente
Publicado em 19/3/18, às 14h26.

coloquio pgrComo uma das atividades paralelas ao Fórum Mundial da Água (FMA), que ocorre em Brasília, foi realizado neste domingo, 18 de março, o Colóquio Latino-Americano Água, Vida e Direitos Humanos.  O evento teve a participação de representantes de ministérios públicos, juízes, legisladores, especialistas e pesquisadores de vários países da América Latina. Foram apresentadas as realidades hídricas de diversos países da região, os problemas enfrentados, as necessidades de investimentos e de ampliação do acesso à água, principalmente pelas populações mais carentes. Para a procuradora-geral da República e presidente do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Raquel Dodge, que defende a água como um direito humano, é importante que esse direito seja incluído na Constituição Federal para que seja, de fato, garantido a todos os cidadãos. “Essa inclusão significa o compromisso do Estado em fazer valer esse direito e, sobretudo, para que não se coloque um preço na água. Mercadoria tem preço, mas direito humano, não”, explicou Dodge.

O senador Jorge Viana (PT/AC) salientou que a humanidade vive uma verdadeira guerra civilizatória, apesar de a sociedade ser tão sabida: “Poluímos o ar, a terra, a água e ainda vivemos um grande desafio, o da imigração. Mas ainda é possível reverter esse quadro quando nos reunimos, debatemos, apresentamos alternativas e agimos. Por isso é tão importante um colóquio como este”. O ministro dos Direitos Humanos e conselheiro do CNMP, Gustavo Rocha, destacou a falta de água ainda mata ao redor do mundo. “Nem todas as populações têm acesso a esse bem, nem a saneamento básico. Temos de fazer o que está ao nosso alcance para levar a água ao patamar de direito humano, já que todos os outros direitos dependem da água”, ponderou. A diretora de Direito, Política e Governança Ambiental, da Organização dos Estados Americanos (OEA), Claudia de Windt, disse que o evento reuniu representantes que têm consciência do tamanho do desafio que será transformar a água em direito humano.

O colóquio foi dividido em cinco painéis. Confira abaixo, os principais pontos de cada um deles.

Painel 1 – Água como Direito Humano Fundamental

A representante do Ministério Público de Honduras, Mercedes, Ruiz falou sobre os problemas enfrentados em seu país na gestão dos recursos hídricos, destacando a grande utilização de água para a produção de café. A ministra da corte suprema da Costa Rica Damaris Vargas Vasquez ressaltou que a legislação que trata dos recursos hídricos é de 1942. “Nossas leis neste quesito estão obsoletas”, criticou. Para o professor da Universidade Federal do Mato Grosso, Carlos Teodoro Irigaray, o direito ao acesso à agua está diretamente ligado à vida. “E o mais importante é avançarmos nesse grande desafio para garantirmos esse direito. É preciso mobilização da sociedade para que o poder público cumpra seu dever de agir para garantir esse direito. Falamos de um ouro azul no contexto de uma economia marrom”.

Painel 2 – Os Legisladores e as Águas

Na avaliação do senador Roberto Muniz (PP/BA), o Brasil vive um paradoxo. “Temos 12% da água potável do mundo e vivemos uma crise hídrica. Como explicar isso?”, indagou o parlamentar, para quem a qualidade da água e o saneamento básico são os maiores avanços para se reduzir a mortalidade infantil. Ele disse que o modelo de uso da água levou o Brasil a um apartheid social, em que as famílias mais pobres são as mais prejudicadas. Para a senadora do Congresso da União Mexicana e presidente da União Inter-Parlamentária do México, o problema da água é muito mais profundo por causa do uso desse recurso pelos seres humanos. Segundo ela, mais de 700 milhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso ao bem. “Precisamos pensar alternativas globais para que sejam aplicadas localmente”, defendeu a senadora. O senador Cristovam Buarque (PPS/DF) disse que o uso consciente da água virá por meio da educação. “É necessário mudar a mentalidade sobre como nos relacionamos com a natureza. Hoje, a minoria usa a água mal e deixa muitas pessoas sem. A solução estará menos na engenharia e mais na educação, menos nos adultos e mais nas próximas gerações”.

Painel 3 – O Ministério Público e as Águas

O promotor de Justiça do Maranhão e presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa), Luís Fernando Barreto Junior, alertou sobre as macrodecisões relativas às bacias hidrográficas. Para ele, é preciso ter o cuidado para que elas não prejudiquem as microbacias. A promotora de Justiça da Bahia Luciana Koury afirmou que há injustiças ambientais pelo fato de muitas pessoas ainda não terem acesso à água, normalmente, as que têm menos recuros financeiros. Segundo ela, a crise hídrica na bacia do rio São Francisco não é somente por causa da falta de chuva, mas das diversas forma de degradação ambiental e da falta de gestão dos recursos hídricos. Ela chamou a atenção para a flexibilização da legislação ambiental, em especial para a liberação de licenciamentos. “Também não dá para aceitar que as águas passam pelas comunidades tradicionais, que as vêm indo atender aos grandes empreendimentos que produzirão commodities que serão vendidas para fora do Brasil”, ponderou.

O projeto Amazônia Protege, criado pelo MPF em novembro do ano passado, foi apresentado pelo procurador da República Daniel Azeredo. Ele falou sobre os problemas para a fiscalização do desmatamento das florestas e apontou as soluções encontradas pelo MPF para coibir esse crime. Desde o lançamento, o Amazônia Protege já abriu mais de mil ações civis públicas e pediu o pagamento de mais de R$ 2,5 bilhões em multas a infratores. O representante do Ministério Público da Costa Rica, José Pablo Gonzáles Montero falou sobre a fiscalização de forma séria, com coletas de provas científicas de crimes ambientais em seus país e sobre temas delicados para os costarriquenhos, como a pesca marinha, já que muitas famílias sobrevivem da atividade. O representante do Ministério Público do Estado de Quintana Roo, México, Miguel Nadal, informou que em seu país há uma lei nacional que reconhece a água como um bem ao qual os mexicanos têm acesso, mas em quantidade determinada. Ele disse que a legislação ambiental no país é antiga e não considera a questão dos recursos hídricos.

Painel 4 – Os juízes e as Águas

O presidente da Comissão de Desenvolvimento Científico e Pedagógico da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Eladio Lecey, defendeu a necessidade de um Judiciário sensível à proteção da água. Para a desembargadora da Corte de Apelações de Santo Domingo, na República Dominicana Wendy Martinez, o direito difuso da água tem caráter intercontinental. Ela destacou a existência de conflitos em torno da água, disse que a tendência é de que eles aumentem e que o direito internacional deve dialogar sobre o tema. O ministro da Corte Nacional do Equador Pablo Tinajero fez um relato das mudanças ambientais em seu país e destacou pontos como a previsão de punição para o mau uso dos recursos hídricos.

A importância da criação da Vara Federal Ambiental de Porto Alegre foi destacada pela juíza Clarides Rahmeier, que falou sobre as nove ações civis públicas que lá tramitam relativas ao esgotamento sanitário do litoral norte do Rio Grande do Sul. Ela também lembrou o ganho para a região e a própria Justiça com a realização de audiências para se discutir a questão com todos os atores envolvidos no processo. O juiz da Primeira Vara Cível de São Paulo, Álvaro Valery Mirra, ressaltou que as empresas têm dificuldade em cumprir a legislação ambiental e os órgãos públicos não têm condições de fiscalizar. “Quanto menor o empenho e envolvimento do poder público e da iniciativa privada sobre a matéria de proteção ao meio ambiente, maior a necessidade de atuação da sociedade civil”, defendeu.

Painel 5 – Questões Complexas do Direito das Águas

O coordenador do Centro de Apoio ao Meio Ambiente do Rio de Janeiro, Marcus Cavalcanti Pereira Leal destacou a importância da criação dos fundos para aplicação nos recursos hídricos. Segundo ele, somente no seu estado, no ano passado, o fundo recebeu R$ 28 milhões, mas ainda não foram repassados cerca de R$ 200 milhões pelo governo do estado, por causa da crise econômica pela qual passa o Rio de Janeiro. Os conflitos pela água em algumas províncias argentinas foram lembrados pelo professor da Universidad de Buenos Aires, Pablo Lorenzetti. Segundo ele, a corte suprema daquele país concedeu a tutela judicial urgente para tentar resolver os conflitos hídricos, além de ter atuado em ações relativas ao direito fundamental do uso da água potável, como a continuidade do fornecimento do bem para quem não tem condições de pagar por ele.

A professora da Pontifícia Universidade Católica de Santos, Maria Luiza Granziera ressaltou a grande dificuldade institucional no Brasil para se tratar da qualidade da água e lamentou que não há nenhuma sanção prevista para esta falta de ação conjunta das instituições. Ela também destacou a dificuldade dos municípios em garantir o saneamento básico às populaçõe e defendeu a necessidade de a União e os estados trabalharem com os municípios para que todos tenham a garantia do acesso à água potável e ao tratamento de esgoto. Professora da Universidade de São Paulo (USP), Ana Maria Nusdeo lembrou que pouco mais da metade da população brasileira tem acesso à rede de esgoto e que menos da metade do esgoto recebe tratamento. O procurador da República no Rio Grande do Sul Eduardo Viegas argumentou que a solução para o problema do saneamento básico não será coletiva. Segundo ele, é preciso pensar as questões individuais, como a instalação de fossas filtro sumidouro. Viegas criticou a propalada privatização do sistema de saneamento no Brasil: “Não deu certo em Buenos Aires, nem na França e não dará certo aqui no Brasil. Aqui também irá aumentar o valor do serviço, que tem de ser de baixo custo, pois é serviço básico para os cidadãos”, finalizou.

Informações e fotografia (Antônio Augusto): Secom/PGR.

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